sexta-feira, 20 de maio de 2011

suco brasileiro incomoda multinacionais

Destaque "atrás do gol"
Marca criada por ex-vendedor de refresco em pó chama atenção no futebol, cresce 25% e invade prateleira dominada por estrangeiras



Pedro Carvalho, iG São Paulo | 20/05/2011 05:55

Você provavelmente reparou na marca porque ela estava “atrás do gol” em jogos decisivos do primeiro semestre. Mas asmultinacionais estão de olho nela por outro motivo. Após crescer 25% em 2010 e chegar perto dos R$ 200 milhões em faturamento, os sucos Camp se estabelecem de vez como, digamos, jogador da primeira divisão do mercado de refresco em pó – quase totalmente dominada por empresas estrangeiras. Com novos produtos, o grupo promete registrar expansão ainda maior em 2011. “Também pensamos seriamente em abrir uma fábrica no nordeste, porque o custo de transporte é alto”, diz Isael Pinto, proprietário da fabricante.

Foto: Agencia Estado Ampliar

"Futebol associa marca a saúde, o que é bom para sucos em pó", diz consultor

O Camp começou a ser produzido em 1997 na forma de suco em pó, mas hoje tem também uma linha de refresco pronto para beber. Identificado com o consumidor das classes C e D, ele é feito pela General Brands (GB), companhia paulista que fabrica também gelatina, chiclete e adoçante – além de atuar no segmento de food service, no qual, por exemplo, fornece sucos para os voos da Gol, com a marca Top Fruit. Além disso, faz sucos “terceirizados”, que chegam ao mercado com os logotipos Fazenda, Juxx, Carrefour e outros. Mas o suco em pó continua sendo o maior faturamento da companhia – representa em média 55% da receita.

“Hoje estamos nos 27 pedaços da federação e exportamos para Suriname, Japão, Cuba, Venezuela e outros países”, diz Isael. “Vendemos até em Fernando de Noronha, em dois mercados, o Noronhão e o Poti, que é do Zé Maria”, conta. Logo se percebe que Isael parece uma enciclopédia de supermercados – esse, na verdade, foi o segredo do crescimento da GB. “Fazer suco em pó, qualquer um faz, é uma tecnologia dominada, difícil é vender”, diz Adalberto Viviani, presidente da consultoria Concept, especializada no mercado de bebidas. Os bons contatos na rede de distribuição vêm da época em que o empresário trabalhava na Q-Refresco, até o início dos anos 90.

“Naquele emprego, rodei o País várias vezes e criei uma das maiores malhas de distribuição de alimentos populares que o Brasil já teve”, afirma. Parece exagero, mas Isael ia mesmo longe. Subia e descia o rio Amazonas, para que os produtos chegassem aos mercadões flutuantes que abastecem populações ribeirinhas. Varria cidadezinhas do interior do nordeste. Chegou a enganar o chefe, dizendo que conhecia o sul de Minas Gerais e do Vale do Paraíba, para ficar com a gerência da região. “Em vendas, você precisa ser agressivo. Comprei um mapa, decorei durante a noite e disse que sabia tudo sobre o lugar”, conta.

Veja a reportagem em vídeo sobre os sucos Camp
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Após milhares de quilômetros e seguidas promoções na carreira, ele teve um desentendimento com os novos patrões – a Kraft Food, controlada pela Phillip Morris (hoje Altria), tinha adquirido a empresa – e decidiu abrir um negócio. “Eles disseram que seria do jeito deles. Falei que tinham comprado a empresa, não o executivo”, conta. O ano era 1993. Isael resolveu unir sua agenda recheada na área varejista ao câmbio favorável – a entrada em circulação do real deixaria o dólar “barato” – e fundou uma importadora. Distribuía produtos chilenos, argentinos e alemães. Foi um passo seguro para começar a empreender.

Em 1997, quando a paridade entre as moedas dava sinais de que ia acabar e o dólar ia disparar, ele já havia comprado as máquinas que usaria para fabricar suco em pó. Três anos depois, comprou a fábrica onde hoje funciona a GB, adquirida da massa falida da empresa Doces Neusa. “De lá para cá, o consumo de suco em pó cresceu por dois fatores: para famílias que tomavam água nas refeições, passou a ser uma opção que trazia sabor, decorava a mesa e era mais barata que refrigerante”, explica Viviani. “Além disso, passou a ser consumido por essas pessoas como ‘snack’, fora das refeições”, explica o consultor.


Hoje, os números da GB chamam a atenção do setor. Em 2010, a empresa vendeu aproximadamente 300 milhões de litros de suco em pó. Em regiões do Maranhão e do Piauí, ela chega a ter 70% de participação nas vendas desse segmento, segundo o empresário. Fez também cerca de 40 milhões de litros do tipo néctar – como é chamado o suco pronto para beber. O Top Fruit, que antes só atendia a demanda de food service, foi parar nas gôndolas dos supermercados – e já é líder em Manaus.

O crescimento colocou o Camp entre os grandes do suco em pó. “As marcas fortes no mercado hoje são a Kraft com o Tang e o Clight, a Ajinomoto com o Mid [as duas controladas por capital estrangeiro], a GB com o Camp – e aí entram o Frisco e algumas outras”, afirma Isael. Para 2011, a GB projeta crescer 26% e deve entrar nos segmentos de bebidas de soja e sopas.

Além de lançar novos produtos, ela aposta na continuidade do aumento dos gastos da classe C. “O consumo desse segmento não mostra saturação”, diz Marcos Gouvêa, sócio da consultoria GS&MD. Além disso, a GB está na mira de grupos de investimento, que manifestam interesse em comprar 15% da companhia, hoje integralmente controlada por Isael. O empresário recentemente adquiriu uma participação minoritária de um sócio, mas parece satisfeito com a ideia de receber investimentos externos. “Permitiria reduzir o endividamento bancário e o pagamento de juros”, diz.

Veja como é fabricado o suco Camp.


O empresário diz ter sido “muito bom” o retorno dado pela exposição da marca nos gramados de futebol. O anúncio aparecia nos incontáveis replays dos gols, que passam nos programas esportivos – e, para crescer, é preciso aparecer. “É uma aposta certa, porque futebol traz associação com saúde, o que é ideal para sucos em pó”, explica Viviani. A GB vai investir R$ 5 milhões em marketing ao longo do ano – o mesmo valor que planeja gastar em equipamentos. “Chega um momento em que você tem que decidir para onde vai a empresa”, diz Isael. “Nós vamos ‘para as cabeças’”.

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