Para Ouvidoria da Polícia, agentes são mortos quando estão fazendo "bico"
As principais vítimas são policiais militares. Dos 811 agentes que foram vítimas de homicídio quando estavam fora de serviço entre os anos de 2001 e 2010, 80% eram PMs. Só no ano passado, enquanto 14 PMs morreram em serviço, 55 foram vítimas de assassinatos quando estavam de folga.
Para o presidente da Associação de Cabos e Soldados da Polícia Militar do Estado de São Paulo, Wilson Morais, o alto índice de mortes de PMs fora do horário do serviço ocorre porque os policiais se dedicam a trabalhos paralelos, os chamados “bicos”, nos seus dias de folga.
- O policial que está trabalhando tem mais segurança. O que está fazendo bico protege um local que tem dinheiro, pode ser uma lotérica, um supermercado. E é onde o bandido ataca. Quando ele está trabalhando na rua, ele está fardado, com equipe e viatura.
Segundo Morais, existe um verdadeiro “exército brasileiro” de policiais que fazem "bico". Ele afirma que os agentes se arriscam a prestar segurança para estabelecimentos particulares para aumentar a renda mensal e dar uma "vida digna à família".
- Praticamente 80% dos policiais militares fazem bicos para complementar o salário, e nós temos 100 mil policiais militares em todo o Estado. Tem mais policial fazendo bico do que policial trabalhando no horário de serviço.
De acordo com a associação, um policial militar na capital paulista ganha, em média, R$ 1.800, além de um vale-refeição de R$ 4 por dia, apelidado de "vale-coxinha" pelos agentes. No interior, o salário médio é de R$ 1.600.
- O que falta é o valorização do policial. Em vez de fazer bico, ele podia estar estudando, se profissionalizando.
O ouvidor da Polícia de São Paulo Luiz Gonzaga Dantas concorda com Morais e afirma que o índice de mortes aponta que é preciso melhorar o salário tanto do policial militar quanto do civil.
- As duas polícias têm o dever constitucional de fazer a segurança pública da sociedade. Se você não tem uma polícia que ganha razoavelmente bem, o policial vai viver muito estressado. Ele está lidando com a vida e a morte todos os dias, e isso é uma questão muito séria.
Apesar de ver com bons olhos a criação da Operação Delegada – em que policiais são pagos pela Prefeitura e Governo de São Paulo para fazer o trabalho de segurança em dias de folga -, Morais diz que a medida ainda está longe do que pode ser considerado “ideal”.
- Na falta do melhor salário, é melhor ter a operação delegada, que é um 'bico' seguro.
Também chamada de “bico oficial”, a operação começou a ser implementada em dezembro de 2009 em algumas subprefeituras da capital e passou a ser ampliada para outras cidades do Estado como Barretos, Sorocaba e Ribeirão Preto.
Para o ouvidor Dantas, que defende uma equiparação salarial com os policiais de Brasília, a operação não resolve o problema de fato.
- O que a ouvidoria defende é que haja um salário digno sem você ter essas gratificações, bônus, que quando o policial se aposenta, caem. Muitos nem querem se aposentar. Então é um problema a ser estudado.
Procurada pela reportagem, a Associação dos Investigadores de Polícia do Estado de São Paulo não se pronunciou sobre o assunto até a publicação desta matéria.
A prefeitura diz que, para este ano, o orçamento previsto para a Operação Delegada é de R$ 100 milhões. Em 2009, o investimento foi de R$ 376.767,93 e, em 2010, R$ 24.919.277,81. Os PMs ganham R$ 12,33 por hora (praças) e R$ 16,45 por hora (oficiais). Todos podem trabalhar até 96 horas por mês na operação.
Outro lado
Em nota, a SSP (Secretaria da Segurança Pública), em nome da Polícia Militar e da Polícia Civil, informou que "têm trabalhado firmemente pela redução da letalidade policial". Entre os fatores citados para a diminuição da mortalidade, a SSP cita o Método de Tiro Defensivo para a Preservação da Vida, o controle diário de disparos, o fortalecimento da ação das corregedorias das polícias Civil e Militar, a atuação da Ouvidoria das Polícias e avaliação psicológica dos policiais.
Já a Polícia Militar, mesmo sendo citada pela SSP, enviou nota própria em que afirma que "tem investido fortemente em equipamentos de proteção individual e treinamento de técnicas policiais modernas para dar maior proteção ao profissional. A implantação da atividade delegada é também uma importante medida para aumentar a proteção do PM, pois permite que trabalhe com toda a estrutura de segurança à sua disposição, como sistema de comunicação, armamento, equipamento e apoio, reduzindo assim o risco a que é exposto em atividade extra-Corporação".
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